domingo, 9 de dezembro de 2018

Intolerância e Democracia

Carlos Nina*

Só a ignorância ou o fanatismo explicam a intolerância. Ou a má-fé, como usufrutuária do caos que esses vícios ensejam. Conclusão a que me levou o que presenciei nas últimas eleições, plenas de revelação dos reais interesses que moveram candidatos e apoiadores.

O exercício da cidadania é conduta política, ainda que não partidária, e contempla o ato de votar na escolha de parlamentares e governantes, dado que o País diz-se república democrática, cuja constituição garante, dentre outras, as liberdades de expressão, crença e culto.

Ao registrarem seus programas, alguns partidos consignaram propostas atentatórias a essas liberdades. Na última campanha houve quem defendesse tanto o cerceamento ao direito de opinião, como à liberdade de comunicação e à fé religiosa, propalando que isso é defender a Democracia.

Mentira! É intolerância.

A Democracia é incompatível com a intolerância. Nenhum partido político ou segmento social é dono da verdade. Tem até o direito de arrogar-se e propalar tal prepotência, mas agir como tal, instigar a violência, usando a ignorância e o fanatismo para causar o caos social, aí revela má-fé e resvala para o crime.

O que se viu nessas eleições foi a intolerância sobrepujar-se a laços de sólidas e antigas amizades, minando-as e até as rompendo, pela absoluta falta de diálogo, de tolerância, de compreensão e até de respeito.

As eleições definem os dirigentes do País, de acordo com a vontade popular, na conformidade do parágrafo único do artigo 1º da Constituição Federal: “Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.” Isso não significa inexistência de oposição aos eleitos. Ao contrário. O pluralismo político é assegurado constitucionalmente no mesmo artigo 1º, que o prevê como fundamento da República e da Democracia.

Entretanto, assim como os eleitos estão atrelados aos ditames constitucionais, seus opositores, também. Todos os brasileiros estão sob a égide do inciso II do artigo 5º da Constituição Federal, base da norma que define a igualdade perante a lei: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.

Isso significa dizer que a ninguém é dado o direito de, no exercício de suposto direito seu, violar direito de outrem. É isso, porém, o que fazem alguns insatisfeitos com resultados que não lhes são favoráveis, apesar de decorrentes das regras democráticas. Reagem com baderna, depredação, violência. Tal conduta por si só mostra o que, para esses, é Democracia: só o que lhes convém. Isso não é Democracia. Democracia é saber conviver com a divergência. Respeitá-la. Por isso a Democracia é desafiadora. É um processo em permanente construção, que começa com a formação de valores no seio da família e tem continuidade na educação escolar e universitária, sem doutrinação partidária. Por isso manter a Democracia exige, parafraseando o irlandês John Philpot Curran ou o americano Thomas Jefferson, eterna vigilância.

Que o espírito do Natal inspire a todos para que se conduzam como construtores da sociedade livre, justa e solidária de que fala a Constituição.

*Advogado.

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