quarta-feira, 14 de dezembro de 2022

Prefeito com contas reprovadas por ato doloso de improbidade é sempre inelegível

Voto do ministro Benedito Gonçalves, relator, foi acompanhado por unanimidade

O prefeito que tiver as contas relativas ao exercício anual do mandato reprovadas pela Câmara Municipal por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa será considerado inelegível mesmo sem a imputação de débito.

Com esse entendimento, o Tribunal Superior Eleitoral decidiu na noite de terça-feira (13/12) indeferir o registro da candidatura de Juninho da Padaria (Patriota) ao cargo de deputado estadual por São Paulo nas eleições deste ano. Ele recebeu 6,9 mil votos e não foi eleito.

A conclusão partiu de uma importante definição feita pelo colegiado: a de que a Lei Complementar 185/2021, que restringiu a inelegibilidade por rejeição de contas aos casos em que os responsáveis tenham sido condenados com imputação de débito, só é válida nas situações em que as contas tenham sido rejeitadas pelo Tribunal de Contas responsável.

Lei suavizada
Juninho da Padaria está inelegível porque, enquanto prefeito de Rio Claro (SP), teve as contas dos exercícios de 2018 e 2019 desaprovadas pela Câmara Municipal por diversas irregularidades, entre as quais a falta de recolhimento de obrigações previdenciárias, o que configura ato doloso de improbidade administrativa.

Em teoria, incidiria sobre ele a inelegibilidade prevista no artigo 1º, inciso I, alínea "g", da Lei Complementar 64/1990. A norma pune exatamente os que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicos rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa.

Recentemente, com o objetivo de suavizar essa norma, foi sancionada a Lei Complementar 185/2021. A norma incluiu o parágrafo 4º-A no artigo 1º da LC 64/1990 para fixar que a inelegibilidade da alínea "g" não se aplica aos responsáveis que tenham tido suas contas julgadas irregulares sem imputação de débito e tenham sido sancionados exclusivamente com o pagamento de multa.

O intuito foi evitar que agentes públicos perdessem os direitos políticos pelo cometimento de infrações formais, de pequeno potencial ofensivo e que não tenham causado dano ao erário ou enriquecimento ilícito dos envolvidos ou de terceiros.

Foi com base nisso que o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo deferiu o registro da candidatura de Juninho ao cargo de deputado estadual. A corte considerou que a Câmara Municipal de Rio Claro apenas rejeitou as contas dos exercícios de 2018 e 2019, sem qualquer determinação quanto ao pagamento de valores.

Interpretação rígida
O problema é que as Câmaras Municipais, ao analisar as contas dos prefeitos, não têm o poder de impor o pagamento de valores. Os únicos caminhos são aprovar as contas, aprová-las com ressalva ou desaprová-las totalmente.

A consequência direta é que, ao aplicar o artigo 1º, parágrafo 4º-A, da LC 64/1990, a Justiça Eleitoral jamais poderá decretar a inelegibilidade do gestor cujas contas tenham sido desaprovadas pela Câmara Municipal, não importa o motivo.
Para o ministro Benedito Gonçalves, relator do caso no TSE, não é razoável que o dispositivo seja aplicado "de modo absolutamente incompatível com a proteção dos valores da probidade administrativa e da moralidade para o exercício do mandato".

"Impõe-se inferir interpretação conforma à Constituição Federal ao parágrafo 4º-A do artigo 1º da Lei Complementar 64/1990, afim de que essa regra incida apenas nas hipóteses de julgamento de gestores públicos pelos tribunais de contas", resumiu ele.

Com a nova orientação, o Plenário do TSE pôde avançar para analisar o caso de Juninho da Padaria e concluir que a rejeição de suas contas foi grave a ponto de gerar déficit orçamentário de R$ 53 milhões para o município de Rio Claro em 2019, além de rombo de outros R$ 65 milhões no regime de previdência do município.

Com isso, a inelegibilidade está mais do que justificada, no entendimento da corte. A candidatura para deputado estadual foi indeferida, mas os votos puderam ser aproveitados pelo partido. A votação foi unânime, conforme a posição do relator.


ConJur

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