sábado, 22 de abril de 2023

PE. BRANDT: Ícone da Educação no Maranhão

 Padre Brandt


José Augusto Silva Oliveira*


Sacerdote, professor, educador, pesquisador, historiador, político e escritor, o Monsenhor Clodomir Brandt e Silva, o Padre Brandt, nome com que se tornou conhecido, nasceu em Colinas, MA, a 22 de novembro de 1917. Filho de Sebastião Gonçalves Silva e Carolina (Sinhá) Brandt e Silva, era o quinto de uma família de nove irmãos. Residiu em Caxias e ingressou no Seminário Santo Antônio, em São Luís, em 1932, ordenando-se padre em 1ᴼ de janeiro de 1943, na catedral metropolitana, por D. Carlos Carmelo de Vasconcelos Motta. Em discurso pronunciado naquela data, por certo pontilhado de extrema emoção, faz-se destacar: E hoje, que consoladora verdade, fui ungido para o serviço do altar, para a corte de Deus, para o ministério do Altíssimo. Que grandeza! Que esplendor! Que bondade do Pai Onipotente! Fazer de um pobre e fraco homem, cheio de misérias e pecados, um seu sacerdote, um seu ministro, um outro Cristo! Meu Deus, como avaliar a alegria imensa e a exultação incomparável que vive no meu coração a alargar os horizontes da minha vida sacerdotal.

No dia 2 de janeiro de 1943, um dia após sua ordenação, Pe. Clodomir celebrou sua primeira missa, na Igreja de Santo Antônio, ao lado do Seminário. No dia 3, recebeu sua primeira provisão, assumindo como vigário a Paróquia de São Vicente de Paulo, no João Paulo. Em seguida, foi substituto do capelão da Santa Casa de Misericórdia, Monsenhor Arias Cruz, ocasião reservada a ele pelo destino para assistir aos últimos momentos de enfermidade de seu pai Sebastião, dando-lhe o conforto e a alegria de participar de uma missa do filho, a quem tanto desejara ver ordenado padre, antes de morrer, a 6 de março daquele ano.

Um ano depois de sua ordenação, foi então nomeado vigário de Arari. Partiu em lancha, saindo da rampa Campos Melo em 1ᴼ de janeiro de 1944, rumo ao desconhecido geográfico, humano e espiritual, conforme suas palavras, chegando a Arari no dia 8, logo tomando posse da paróquia, celebrando sua primeira missa no dia 9, iniciando rapidamente sua missão naquela terra, apostolado de mais de meio século de abnegado empreendimento cristão e exercência de amor ao próximo.

Além do zelo extraordinário como sacerdote, Clodomir Brandt tomou como prioridade a educação. Começou com dois alunos, uma pequena mesa e três cadeiras, em um dos cômodos da casa que primeiro o recebeu, que logo se tornou pequeno, obrigando-o a transferir-se algum tempo depois para um imóvel alugado com a chegada de novos alunos. No dia 15 de fevereiro, ainda de 1944, fundou o Instituto Nossa Senhora da Graça, colégio para alunos do sexo masculino. Em 10 de junho de 1945, organizou e instalou uma entidade benemérita a que denominou de Associação da Doutrina Cristã – ADC. Dividiu a ADC em quatro secretariados: Assistência e Promoção Humana; Educação; Catequese e Evangelização; e Cultura, objetivando a promoção do homem em todas as suas manifestações de vida.

Em 1947, fundou o Instituto Bom Jesus dos Aflitos, colégio para meninas. A boa fama do ensino propagou-se por todo o Estado e, não raro, chegavam alunos de outras regiões. O internato, segundo palavras de Diana Brandt, sua tia, e de Carolina (Sinhá) Brandt e Silva, sua mãe, que também dedicaram anos de suas vidas no controle da casa e dos internos, tornou-se famoso no Maranhão e além deste, pelo rigor, não somente dos estudos, mas também por correções de comportamento para a vida, buscando a formação de verdadeiros cidadãos.



Igreja Nossa Senhora das Graças – Arari


Em 1964, instalou o Ginásio Arariense. Em 1965, fundou o pré-escolar Jardim de Infância Menino Jesus. Em 1969, criou a Escola Normal de Arari e, em 1992, o 4ᴼ Ano Adicional. Atualmente, este complexo educacional tem a denominação de Colégio Arariense. Tudo isto feito à custa de muito sacrifício, em muitos casos com recursos próprios, do seu sustento. Ergueram-se capelas, o colégio se ampliou, surgiu uma biblioteca pública, uma cooperativa, uma escola de artes gráficas, uma escola de música, uma escola de corte e costura, um escola de carpintaria, um jornal semanal Notícias, uma livraria, um laboratório, um ambulatório... Outras coisas foram surgindo e o patrimônio da paróquia de Arari passou a contar como um dos maiores da Igreja do Maranhão.

Foi um mestre infatigável, um educador sem rival e pioneiro na região. Sem dúvida, a história da educação maranhense, do século XX, não poderá ser contada sem que se faça referência ao Monsenhor Clodomir Brandt e Silva, como afirma José Fernandes, historiografando o Padre Brandt e sua obra redentora (Caderno A, jornal O Estado do Maranhão, de 26 de abril de 1998). A propósito, quando José Fernandes propôs o nome do Pe. Brandt para sócio correspondente do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão – IHGM, inusitadamente fora dispensado o parecer da Comissão Técnica, exigência do regimento da Casa, merecendo aprovação imediata e unânime, demonstração de inequívoca satisfação em ter o pároco de Arari entre os membros daquele sodalício.

Como pesquisador, historiador e escritor, em meio a tantas atividades, arranjou tempo para escrever vinte e sete livros – romances, teatro e ensaios, inclusive a história de Arari, a genealogia de seus primeiros moradores e da própria família, trabalhos publicados pela Editora Notícias de Arari, também por ele criada. Em Folha caída, minha dor (1989), primeiro romance, relata a história realística do homem do campo, sem terras para plantar, expulso por donos ou pseudo-donos, uma contribuição para o estabelecimento da paz no meio rural em permanente estado de guerra podre, conforme prefacia.

Antecedendo esta publicação, denuncia em Notícias, de 6 de dezembro de 1980: Quando se anda pelo interior do município, através de rústicas estradas de barro, esburacadas e poeirentas, o que se vê de espaço a espaço, são as ruínas de casas, na quase totalidade de palha, casas que foram abandonadas, destruídas ou queimadas... Para onde foi o povo que sofreu a violência? Foi para as cidades, formar o cinturão de pobreza e de aspirações que desafiam as autoridades com soluções que nunca chegam. Casas abandonadas, restos de casas, lugares de casas, símbolos da injustiça e da opressão. Nos romances que se seguem, Os caminhos de Silvânia (1984); Arnaldo (1988); Luzia dos olhos verdes (1ᵊ ed. 1991; 2ᵊ ed. 1997) exercita o conhecimento da realidade interiorana, retratando experiências religiosas, culturais e sociais. A semente que cresceu entre espinho (1989), texto para teatro, não é história – é uma interpretação de fatos sociais usando protótipos que podem estar encarnados em pessoas que são da História.

Jornalista e orador fluente utilizou principalmente o púlpito para o exercício dos seus dons de oratória. Exercendo intensa atividade político-partidária, por mais de trinta anos, conquistou adeptos fiéis e adversários inflexíveis. A sua atuação política, além de polêmica, foi mesclada por lances dramáticos, mormente quando combateu as forças do vitorinismo. Líder absoluto na região, durante considerável número de anos, elegeu deputados em duas legislaturas somente com votação própria. Elegeu quatro prefeitos do município de Arari e a si mesmo vereador majoritário por três vezes.

Viveu sem multa comodidade ou conforto material maior, missionário de uma pequena cidade do interior maranhense, junto do povo simples, a quem se unira pelos laços do amor. Sobre ele, o imortal D. José de Medeiros Delgado, fundador da Universidade Católica, da qual se originou a atual Universidade Federal do Maranhão, quando arcebispo metropolitano de São Luís, escreveu um trabalho retratando sua personalidade, a que deu o título de Pobreza Sorridente. Todo o seu trabalho realizado e vivido com intensidade foi sustentado no lema por ele criado: Vim para servir. Para ele também são as palavras de São Paulo: Combati o bom combate, cheguei ao termo de minha carreira, guardei a fé. Desde agora me está preparada a coroa de justiça que o Senhor me há de dar em prêmio (2 Tm. 4,7). Faleceu na manhã ensolarada do dia 22 de abril de 1998, aos 81 anos de idade. César Abbas Prazeres, em artigo publicado pelo jornal O Estado do Maranhão, de 29 de abril de 1998, expressa um grande desejo do Pe. Brandt: Daqui não sairei. Morrerei com as garras presas à minha Igreja e a este povo. Seu corpo repousa na nave central da Igreja de Nossa Senhora da Graça, em Arari, MA.


*Professor, Ex-Reitor da Uema, Sócio Efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão (IHGM), Membro Fundador da Academia Maranhense de Ciências (AMC), Membro da Academia Maranhense de Ciências, Letras e Artes Militares, Membro da Academia Brasileira Rotária de Letras – Seção do Maranhão, Membro Correspondente da Academia Arariense-Vitoriense de Letras (AVL), do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte e do Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina.

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